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Opinion
Fanon sobre Cadáveres, Loucura e Os Condenados
Fanon on Cadavers, Madness, and The Damned
Lewis Ricardo Gordon
Revista ENTRELETRAS (Araguaína), v. 13, n. 3, set./dez. 2022
2023-03-06

Uma  mulher  foi  atropelada  por  um  automóvel  em  Fort-de-France  quando  Frantz  Fanon tinha 14 anos.Naquela época, as autópsias eram feitas na catedral daquela cidade.Fanon convidou seus  amigos  para  acompanhá-lo  em  uma  expedição  para  testemunhar  a  autópsia  através  de  uma janela  aberta  da  igreja.Seus  amigos  recusaram.Então,  Fanon  foi  por  conta  própria.Ele  ficou enojadocom  o  que  viu.Não  era  o  sangue  que  o  incomodava.Era  o  procedimento  impessoal  e prático.Ali a mulher jazia não mais como pessoa, mas como cadáver.Fanon não separaria a pessoa do  cadáver,  a  mulher  da  carne  dissecada  na  mesa.Ele  testemunhou  degradação, indignidade, humanidade ausente no processo, mas não em seu coração.O menino encontrou sua humanidade e, por meio de sua convicção, seu humanismo.A separação da pessoa do corpo não é uma característica de muitas línguas não europeias, e não foi historicamente assim para muitas línguas europeias.O processo de pessoas se tornando “coisas”  foi  crucial  para  as  práticas  históricas  de  colonização,  escravização  e  violência.A linguagem ativa de muitas línguas crioulizadas no Caribe e nas Américas, além daquelas onde quer que a colonização e o comércio fossem, tinham como premissa a vitalidade.O corpo vivido, por assim dizer, é relacional e dinâmico, e assim as reduções à propriedade e às coisas sempre estiveram em  conflito  com  o  que  estava  no  cerne  do  discursoe  seu  alcance  comunicativo  na  vida  social.

Embora  Fanon  fosse  um  falante  eloquente  do  francês  parisiense,  a  linguagem  orgânica  de  sua infância –o crioulo –não estava apenas ao lado do francês hegemônico imposto e aspirado, mas também um desafio metafísico ao mecanismo cartesiano herdado do corpo como coisa.Essa língua crioulizada, marcada por uma confluência de África, Ásia, Europa e resíduos das línguas dos povos indígenas do Caribe e da América do Sul, honrava os ancestrais como uma obrigação permanente pela  qual  os  descendentes  recebiam  valor.Assim,  apesar  da  lógica  imposta  pela  estrutura gramatical euromoderna a um corpo que se torna um “isso”, os elementos ativos das obrigações contínuas a uma pessoa que se tornou ancestral resistiam àquela designação certeira que tornava eficiente a dissecação de um cadáver em uma laje. >LER ARTIGO COMPLETO



Original Contents by Revista ENTRELETRAS (Araguaína), v. 13, n. 3, set./dez. 2022